O amor tem cor?
Os enfrentamentos da mulher negra numa sociedade machista e racista
Por Helen Castro
Quando se fala de racismo em nosso país, muitas pessoas usam relacionamentos interraciais como argumento de que esse racismo não existe. Quantas vezes você já ouviu ou até mesmo se justificou perante uma acusação de racismo usando a frase “Não sou racista, já até fiquei/namorei uma negra”? Bom, trago más notícias para você: namorar uma negra não te livra de reproduzir racismo.
A mulher negra sofre com a solidão afetiva mais do que qualquer outra, pois desde sua infância é ensinada a se colocar no seu devido lugar. Nas listas das mais bonitas da classe ela sempre apareceu na última posição ou sequer entrou. A garota mais bonita da escola, as princesas que ela admirava, bem como suas bonecas tinham algo em comum: eram todas brancas, magras, com os cabelos lisos e sedosos. Não restava outra opção que não fosse se adequar a estes padrões para, então, ser aceita e vista como uma mulher digna de ser considerada bonita.
Ela pode alisar os cabelos, afinar o nariz e não pegar sol que, ainda assim, ela não será branca e não terá alcançado o que é o padrão de beleza desejável.
No início de sua adolescência, ou até mesmo antes, essa mulher já está acostumada a suportar a dor de queimar a própria carne para fazer com que seus cabelos se parecessem com os de uma branca. A essa altura ela já está acreditando que sua cor a faz inferior. Então, ela não vê problema em modificar e mutilar seu corpo para tentar chegar o mais próximo possível do padrão de beleza.
Ela pode alisar os cabelos, afinar o nariz e não pegar sol que, ainda assim, ela não será branca e não terá alcançado o que é o padrão de beleza desejável. No máximo, receberá elogios hiperssexualizados, afinal de contas a mulher preta é vista como a mulher fogosa, boa de cama, da cor do pecado, mas nunca a primeira opção para se relacionar de maneira séria e para se apresentar para família. E isto, infelizmente, se aplica tanto em relacionamentos heteronormativos como nos homoafetivos, porque as pessoas sempre optam por ter ao seu lado a mulher que é considerada bonita para se exibir à sociedade.
Muitas justificam sua preferência por mulheres brancas, defendendo a questão do gosto pessoal. Acontece que se analisarmos o fato de que desde a infância homens e mulheres são ensinados que quanto mais branco, mais bonito, que princesas, rainhas e heroínas têm a pele clara e cabelos esvoaçantes, é, no mínimo, desonesto não reconhecer que o gosto pessoal é construído socialmente e que amor tem cor e ela não é nada escura.
Falar de afetividade é sempre muito delicado, pois existem inúmeras exceções e fatores particulares. A solidão da mulher negra existe e ela está aí, não adianta fechar os olhos. É importante reconhecer esta solidão quando se está em um relacionamento interracial e, principalmente, quando você é a mulher branca da relação.
Para a mulher negra em alguns casos, relacionar-se com outra mulher de pele clara é como um bônus, como se ela, finalmente, se tornasse visível aos olhos daquela que sempre é considerada superior dentro da nossa sociedade machista e racista. No entanto, o sentimento de inferioridade se faz presente perante os privilégios que esta mulher branca terá sobre ela, e é de extrema importância que essa mulher reconheça esses privilégios e perceba que todo branco reproduz racismo. A diferença está em desconstruí-lo dia após dia, ao lado de sua parceira e socialmente.